segunda-feira, 15 de junho de 2009

A ilusão da época



1900,
Sara mãe de Pedro e João.
Pedro um menino frágil, branco, com bochechas bem rosadas, os cabelos lisos e loiros. Já o João com os seus cabelos negros e também lisos, mais magro do que Pedro, e um fato inesperado, aos poucos foi sendo privado da visão.
Sara uma mulher elegante e gentil, com os seus 30 e poucos anos, filha de portugueses, bastante branca com os seus cabelos cacheados, presos por alguns grampos prendendo o todo, deixando alguns dourados fios soltos, por fim um chapéu bege com babados para cobrir um pouco do seu rosto.
A vida de Sara era regrada de fatos, detalhes e narrativas, para que o mundo de João fosse o mesmo de Pedro pelo menos semelhante.
Ela era mãe solteira morando perto do Rio Sanhauá, com os dois filhos em um sobrado. Tinha uma sala, com seu sofá português, e sua arca de madeira escura, a apoiar suas taças de cristais e porcelanas com gravuras em azul, provavelmente de Portugal. Do lado, então, o primeiro quarto, que Sara o fez dispensa. Mas na frente sua mesa com mais de duzentos quilos acompanhada com cadeiras de madeira e acolchoadas com veludo vermelho, o piso combinando com o teto, todo de madeira. A cozinha que vinha na seqüência era pequena com o fogão a lenha junto com seu ferro de passar e algumas panelas de barro.
No andar de cima dois quartos, seu e dos meninos. E logo na frente uma varanda toda de madeira para um pôr-do-sol inesquecível de todos os dias. E ao fundo um banheiro pequeno todo com azulejos brancos.
Viviam bem com o dinheiro que o pai de Sara tinha deixado antes de morre, coisa que ela sabia administrar muito bem.
Fumava rolos de cigarros que comprava com alguns coronéis da época, que além de vender os rolos de fumo, a pedia em casamento. Sara nunca aceitava, só queria tratar-se dos filhos e mais nada.
Ao passar dos anos, o João morre com cegueira total e tuberculose. Sara resistiu com força e coragem.
Fez de tudo para que Pedro estudo medicina e passe a ser um homem de bem e independente. E foi exatamente que aconteceu.
Aos seus 99 anos, hoje Pedro descreve toda essa história em uma carta, que a escreve todos os dias, sempre a completando e essa dificuldade é por ter mal de Alzheimer.
“minha mãe morreu aos 87 anos em 1970, lúcida, gentil e linda, foi minha guerreira e a do meu irmão, até o fim. Obrigado ó bela, doce, branca mãe.’’

Um comentário:

  1. Com o passar do tempo a gente percebe o quão forte é o nosso espirito, se livre for.
    Percebemos também aqueles que nao nos abandona, mesmo morrendo em carne, mas vivendo para sempre em pensamento.
    Nao nos importa todo o adorno de madeira antiga, veludos vermelhos, nem muito menos os cigarros de rolos que comprava.
    O que te ofereço sao os inúmeros pôr do sol que contemplarás de tua varanda, bordeada pelo rio, que banha e lava teus pés, purificando-os. E mesmo com toda a força, com toda lâmina, a gente vai levando... levando. E conseguimos, senão por mérito próprio, pela beleza de ter vivido dias vívidos e limpidos, lembrar-nos dos cigarros, dos sorrisos, da gentileza, e da maior fonte de riqueza, o amor que foi exemplo de todos os dias nesta casa de adornos tão bem reparados e descritos.
    Que não passe, tudo, de uma ilusão.
    Mas que seja sempre o começo de uma história rica em detalhes.

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